“Aleksander, como definimos a representação da base categorial que conformam as relações gramaticais entre as estruturas profundas?”
Lembro do jeito firme, seguro e – sempre – elegante que ela tinha de pronunciar meu nome. Esqueçamos o medíocre sujeito e predicado. Fui apresentado, por ela, embasbacado, ao Sintagma e ao conceito de unidade sintática. Dai veio o cosmos... a Gramática Gerativa, criticas aos modelos distribucionistas, o próprio Noam Chomsky (e o conheci assim, um lingüista divisor de águas, muitos antes de saber de sua versão política), diagramas arbóreos: era a Língua, a Lingüística; era um universo inteiro que se revelava, passava a fazer sentido. Graças a ela.
Foram várias vezes em que ela teve que fazer com que eu voltasse à Terra quando viajava demasiadamente empolgado em discussões nas salas da Faculdade de Letras da UFPel pelo universo da Pragmática e da Estilística. Cada aula era um orgulho, uma realização, um arrebatamento. Que sensação poderosa eram os insights, a percepção de descoberta e de compreensão que ela gerava! Era um desafio e um privilégio acompanhar sua irrepreensível atuação. Sim, porque ela não dava aula, mas performava. Já era uma lenda viva naquele tempo. Edith Barreto era o nome que transpirava respeito e admiração e inclusive medo. Ser aprovado nas cadeiras ministradas por ela era sinônimo de superação, valor. Se fosse com uma boa nota, a coroação do êxito.
Edith não era apenas brilhante, mas instigante, dona de uma finíssima ironia além de paciente e sofisticadamente educada. Ao mesmo tempo um mistério. Ate hoje, um Google com o seu nome traz como resultado quase nada e imagens dela na web parece ser algo impossível de se encontrar. Pouco sabia da sua vida pessoal, da sua trajetória humana. Aparentemente vinha de uma família abastada, mas nos permitia ver que suas posições políticas não eram conservadoras, como naturalmente se pensaria, mas progressistas.
Edith Barreto era para mim, e sempre será, um nome mítico. Era e é ainda o nome do Diretório Acadêmico da Faculdade de Letras da UFPel, nome escolhido pelos próprios estudantes em algum momento de epifania. (** Depois de ter publicado este poste fui informado que o nome do D.A havia mudado nos anos 2000 sob o argumento de que Edith ainda estava viva. Como se homenagens fossem apenas para os mortos...). Fiz parte, também com orgulho, da Coordenação Geral da entidade em 2000-2001 numa época em que travamos grandes lutas estudantis. Mas lamento não ter nenhuma foto da Edith, nem com ela. Seria como guardar aquelas lembranças de objetos queridos e representativos que são mantidos como um componente do que se é. Tenho dois livros que ela me presenteou em uma das duas vezes que fui até sua casa, tímido e orgulhoso, para discutir um projeto lingüístico. Um desses livros foi também um marco na minha formação e paixão por política e semiótica, lingüística e comunicação. Edith foi uma das responsáveis, entre pouquíssimas em tão decisiva lista, por me apresentar um mundo. E a isso sou grato e por isso seu declarado admirador. Obrigado, Edith.
O mundo perdeu Edith Barreto na segunda-feira, dia 27 de setembro. Entre as várias coisas que não sei sobre ela, deduzo que a sua idade era mais de 60 e menos de 80. Quando recebi a noticia através de amigos da época da Faculdade, ela já havia sido enterrada. Ao que parece, ela travava a algum tempo uma luta contra um câncer, mas eu pouco sabia do que lhe passava nos últimos anos. Senti uma particular tristeza por haver estado na cidade, Pelotas, este ano e ter perdido a oportunidade de ver-la, mas registro, entre tanto que acontece no mundo nesta semana e tanto que tenho para escrever, minha homenagem a alguém que de fato a merece. Edith Barreto é alguém pra chamar de mestra.
P.S: Dêiticos também é um conceito que me foi apresentado por Edith Barreto e que dá nome e sentido a este blog.
P.S 2: A conhecida professora Paula Mascarenhas, da Faculdade de Letras da UFPel, que de alguma maneira encontrou esta homenagem a Edith na rede, deixou gentil comentário neste post, compartindo respeito por Edith, e re-corrigindo o dito anteriomente: o nome do D.A da Letras segue, sim, tendo o nome de Edith Barreto.
13 comments:
o mundo perdeu edith barreto! e ela era maravilhosa, finíssima, incisiva, tinha classe e, sem dúvida, foi a melhor professora que eu ja tive! ela realmente foi uma mestra!
Daniele, desculpe a pergunta aleatória - justifico explicando que nao tenho certeza apenas olhando pra foto que tens no teu perfil - mas tu nao fostes minha professora de português no Pelotense?
sim, fui tua professora no séc. XVIII, heheheh!!!
Ao longo da vida, a gente se depara com professores mestres. Aqueles que a gente leva pra sempre. Não a conheci na Faculdade de Letras, mas muito já ouvi falar.
Ah e só pra constar: eu também estudei no Pelotense! hehe...
Aleksander, eu não te conheço, em 2000 e 2001 estava afastada da Faculdade de Letras, mas lendo o que escreveste soube que tivemos uma percepção muito parecida sobre a experiência desestabilizadora, arrebatadora, única, de ser aluno da Edith. Eu, que só o fui por um ano, na sintaxe, invejo aqueles que a tiveram na semântica, na estilística... quando a Edith se aposentou, em 88, eu fiz um luto que acabou me afastando para sempre da Linguística. De alguma forma, graças a ela sou professora de Literatura e graças a ela experimentei algumas das maiores emoções que tive na minha vida acadêmica. Bela homenagem fizeste. Um abraço
Paula Schild Mascarenhas
Esqueci de dizer na mensagem anterior: o DA de Letras segue se chamando Edith Barreto.
Professora Paula Mascarenhas, tampouco a conheço pessoalmente, mas certamente a conheço de nome pela sua presença na vida pública local da cidade de Pelotas e que mesmo hoje, desde longe, tento acompanhar. Uma satisfaçao ler seu comentário e saber que há outros que compartem o sentimento de privilégio de ter sido aluno de Edith Barreto. Obrigado também por corrigir-me sobre o nome do D.A. O nome da Edith foi retirado e depois retomado pela entidade, entao?
Saludos cordiales
Ediane, lástima que nao tivesse a oportunidade de conhecer a Edith. E sobre o Pelotense, pois sim, mais pontos em comum!
Professora Daniele, que ótimo "encontra-la" por aqui! Nao creio que a tenha visto desde aqueles idos do século XVIII... E bom saber que também compartimos o respeito e admiraçao pela Edith. Grande abraço e keep in touch!
Olá! Eu sou de Montevidéu, Uruguai, minha avó é a prima de Edith Barreto. Na sua juventude, eles tiveram muito contato através de cartas, mas minha avó casou-se, formou uma família e parou de escrever. Uma semana atrás, ela me pediu para procurá-la na Internet, minha avó queria saber sobre ela e contatá-la. E então encontrei esta notícia. Minha avó vai ficar muito triste quando eu digo a ela!
Procurando o nome da Professora Edith Barreto no Google, deparei-me com a triste notícia de sua partida no ano de 2010.
Tive o prazer de ser sua aluna no curso de Letras, o qual não concluí.
Aulas maravilhosas nos anos de 1986 e 1987.
Deus a tenha em Seu Reino de Felicidade.
Cláudia Ferreira
Claudia e Lucia, muito interessante o carinho e o despertar sobre a Edith. Já sao 7 anos sem a mestra, mas que bom que esse singelo texto de homenagem teve a oportunidade de servir de alguma informacao sobre ela. Um abraco de um outro discipulo de Edith.
Boa tarde
Sou professor do Col Mun Pelotense, disciplina de Geografia. Trabalho no CMP, Col Mun Pelotense, há 27 anos.
O que me traz aos comentários é me referir à Professora Edith Barreto, com muito orgulho, pois fui aluno da grande Mestra, lá mesmo no Col Pelotense. Professora de Francês. Fiquei fascinado com aquela grande Professora no conhecimento e na didática desempenhada na sala de aula. Incrível, nenhum aluno tinha medo de falar e/ou ler para a turma.
Professora Edith Barreto transmitia-nos a maior confiança e o respeito, sem nunca chamar a atenção de aluno. Sua metodologia na sala de aula era era atrativa, pois a elegante professora proporcionava-nos a aprendizagem, com maior índice de aprovação, cujas avaliações não eram fáceis, não. Dificuldades características no processo ensino-aprendizagem eram, no mínimo, medianas para difíceis.
Aprendíamos, porque a Professora Edith Barreto ensinava mesmo, sem deixar algum aluno na dúvida. Este relato era no tempo do ginásio, a LDB era a 4024. Correspondente aos dias atuais à 6a Série, há pouco tempo atrás, atualmente, 7° Ano.
Escrever aula por aula da Mestra Edith Barreto levaria muitíssimo tempo e não se poderia utilizar pouco tempo, ao contrário, precisaria de uma vasta pesquisa, desde os tempos do Col Mun Pelotense.
Grato pelo espaço.
Ex-aluno do Colégio Mun Pelotense e professor há 27 anos na instituição.
Prof Luiz Cláudio Guterres,
(Luiz Guterrez)
estimado Luiz, obrigad pelo teu testemuho. vejo esse teu comentário apenas agora. Vou lhe procurar nas redes sociais para compartilhar algumas impressões e quiçãs ideias sobre a professora Edith.
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