Saturday 23 October 2010

Textos curtos para Ítaca VIII

Um futuro-presente projeto literário. “Textos curtos para Ítaca” é a primeira materialização de uma das várias e extensas idéias em literatura, essencialmente em prosa, mas com flertes em verso, colecionadas ao longo da jornada até Ítaca. Em fato, os projetos para contos e novelas e outras literaturas de longo fôlego, ainda estão em fase sketch, talvez nem maquete, e irão tomando forma ao ritmo das circunstâncias, que sim, podem tardar como já tardam, mas ainda virão. Enquanto isso, num dia e momento aleatório, curiosamente com menos atraso, vão tendo agenda as mini-experiências em poesia e verso, do qual, lenta e despretensiosamente, faço um laboratório neste blog (único espaço onde o critério editorial é totalmente meu... ). Algum dia também ganharão forma impressa, sempre ao ritmo das possibilidades e, no dizer de Konstantinos Kavafis, do rogar por uma rota longa. Mas em textos curtos.


Aliterações Rodrigueanas


Dorotéia, hiena,


restricela.


Responde, conterrânea,


à Crista e Calista,


à romana Capadócia


repica,


dileta herege


renegada, rasteja


rameira comedida,


restricela.


*Aliterações são repetições da mesma consoante ao longo do poema. O leitor deve buscar seu efeito em função da significação no texto.


**Dorotéia são duas:


- uma santa católica, virgem e mártir, conhecida como a santa das flores, que ao converter duas prostitutas condenou-as à morte.


- uma das peças menos conhecidas de Nelson Rodrigues e foi raramente encenada, segundo o crítico Anchyses Jobim Lopes. Trata-se possivelmente da obra mais controversa de todo o polêmico repertório dramático rodrigueano. O texto começa:


"Casa de três viúvas - d. Flávia, Carmelita e Maura. Todas de luto, num vestido longo e castíssimo, que esconde qualquer curva feminina. De rosto erguido, hieráticas, conservam-se em obstinada vigília, através dos anos. Cada uma das três jamais dormiu, para jamais sonhar. Sabem que, no sonho, rompem volúpias secretas e abomináveis.

Ao fundo, também de pé, a adolescente Maria das Dores, a quem chamam por costume, de abreviação, Das Dores. d. Flávia, Carmelita e Maura são primas.

Batem na porta. Sobressalto das viúvas. D. Flávia vai atender; as três mulheres e Das Dores usam máscaras."


Chega outra prima - Dorotéia - que em contraste com a soturna castidade das mulheres de luto veste-se de vermelho, como as profissionais do amor e não usa máscara. Dorotéia define-se como um ser extremo, de contrastes brutais.

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