Sunday 9 December 2007

Porque nao uso guarda-chuva

Da minha mesa no trabalho, sexta-feira passada, conecto os fones no computador e ouco o pessoal da Ipanema FM, da capital querida de todos os gauchos, anunciar: “Sao 7h10m e hoje a maxima prevista eh de 30ºc. Amanha a maxima sera 35ºc e a previsao eh de ceu claro tanto no sabado como no domingo."
Enquanto isso, o site do BBC Weather Centre, avisa: “O clima predominante na segunda-feira sera de chuvas intensas. A temperatura maxima sera de 7º c e a minima de 0ºc”. A semana nao comeca muito diferente do que foi o fim de semana. E assim sucessivamente. Londres, grosso modo, mantem-se nesses termos de outubro a marco.
Falar, ou reclamar, do tempo na Inglaterra eh quase uma codigo obrigatorio de conduta. Aprendi porque a previsao do tempo eh algo tao presente no cotidiano ingles. Ora, num pais em que os dias de sol sao raros, eh preciso um planejamento de larga antecedencia para qualquer programa outdoor.
O problema, porem, nao eh o frio, especialmente para pelotenses (eh um orgulho municipal acreditar, verdade ou nao, que a cidade figura entre as mais – ou a mais – umida do mundo, informacao relevante no final do pagina linkada). Certa vez conversei com a mae de um amigo aqui que, sendo natural de Arroio Grande e morando na Europa ha mais de 20 e no Reino Unido ha mais de 15, afirma sem pestanejar que Pelotas eh a cidade mais fria que ela ja viveu. Culpa da falta do heat, do chuveiro eletrico que nao aquece direito, do despreparo estrutural numa regiao do Brasil que esquece que nao eh tropical.
Assim, acostumado a lidar com o frio a la gauderia, o dificil mesmo eh a falta de sol, de claridade. Nesta segunda, por exemplo, o nascer do sol sera as 7h53 e o por-do-sol sera as 15h51. Se essas horas fossem efetivamente de sol, mesmo que esse seja o periodo exato em que se esta no escritorio, pelo menos teriamos a satisfacao de ver um ceu azul e se expor a uns timidos raios no horario de almoco, como muitas vezes ocorre no inverno do sub-tropico. Mas nao! Aqui o sol passa encoberto e com sorte nao havera vento ou a eterna garoa murrinha.
Por isso, sigo confiante e com base pratica para explicar porque nao uso guarda-chuva. O texto abaixo, de Mario Prata, publicado no Estadao em 94, compartilha meu entendimento. Londres e Pelotas definitivamente tem similaridades.
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Why I do not use umbrella
At my desk, last Friday, I plug the earphones in the computer and hear the people from Ipanema FM, the beloved gaucho’s capital, announce: It is 7h10m and the max temperature today is 30ºc. Tomorrow the max is 35ºc and it will be sunny both on Saturday and Sunday.
Meanwhile, the BBC Weather Centre website warns: “Monday’s predominant weather forecast is to be heavy showers. The max day is 7º c and the min night 0ºc”. The week starts not differently from what the weekend was. And that is the way it goes. London, roughly speaking, keep itself in this way from October to march.
Speaking, or complaining, about the weather in England is almost a mandatory behavior code. I have learned why the forecast is something so intensely present in the English everyday life. Come now, in a country where the sun is a rare object, an advanced planning is needed for any outdoor program.
The problem, actually, is not the coldness. For pelotense people even less (it is a sort of local pride to believe, rather it is true or not, that Pelotas figures amongst the dampest cities – if not the dampest –in the world.) Once I talked to the mother of a friend here, who being from Arroio Grande, lived in Europe for over 20 years and currently living in the UK for over 15 years, has said without batting an eyelid that Pelotas is the coldest city she has ever lived. This is certainly the heat’s lack's fault, the electric shower rather the gas one, the precarius structure of a Brazilian region that forgets is not tropical.
Hence, accustomed to deal with the coldness a la gauderia, the hard part is the lack of sun, the lack of brightness. This Monday, for example the sunrise will be at 7h53 and the sunrise at 15h51.
If this period was of effective sun, even if this is the exact period one is at the office, we would at least have the satisfaction of seeing the blue sky and being able to expose to the shy sunshine at the lunch break, as many times occurs in the winter of the sub-tropic.
But not! Here, it is often cloudy and if we are lucky there will not be windy or drizzling.
Thus, I go confident and based on practical facts to explain why I do not use umbrella. The Mario Prata's text below, published in the Estadao in 1994 (only in Portuguese) shares my understanding. London and Pelotas definitely posse similarities.
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"GUARDA-CHUVA—Armação de varetas móveis, coberta de pano ou outro material, usada para resguardar as pessoas da chuva ou do sol. "Tá no mestre Aurélio.
Estamos quase no século 21. Nos últimos anos a informática mudou o mundo. Todas as ciências, todas as profissões, toda a sociedade foram beneficiadas por ela. O mundo evoluiu. Já conseguimos pousar até em Marte. Tudo é moderno. Mas, se você observar bem, vai perceber que um único objeto jamais se modernizou. É o mesmo desde que foi inventado. O guarda-chuva.
O guarda-chuva. Existe coisa mais antiga que o guarda-chuva? Desde que foi inventado é igual. Talvez nem tenha sido o homo sapiens quem tenha tido esta idéia primária. Talvez, antes, algum macaco, um dia, com a macaca, pegou umas folhas de palmeira, umas varetinhas, espetou um galho e foram namorar cantando na chuva. Com o mesmo guarda-chuva que Gene Kelly cantaria milhões e milhões de anos depois.
Observe a sua cidade num dia de chuva. Não parece que estamos nos anos 50? Ou menos? Não é satisfatório imaginar que este objeto que você abre quando chove foi usado um igualzinho pela Cleópatra, pelo Caim, pelo Matusalém, pelo D. Pedro I, pelo Maquiavel, pelo Tiradentes, pelo Einstein? Isso nos iguala ao resto da humanidade. E daqui a milhões de anos, estarão usando o mesmo guarda-chuva?
Estive na semana passada em Brasília. Choveu. Os brasilienses abriram seus guarda-chuvas. A cidade perdia o seu encanto de modernidade e ficava parecendo com a Rua Direita de qualquer cidade do mundo.
De uns tempos para cá inventaram uns que se dobram uma, duas vezes, coloca-se uma capinha, cabe na bolsa de qualquer um. Mas, quando se abre, fica igual ao usado por qualquer russo do século passado. Tem de pano, de plástico, de couro. Tem varetas de alumínio, de madeira, de silicone, até. Mudam o cabo. Fazem cabos retos, tortos, com bolotas na ponta. Mas são todos iguais. Tem preto, branco, colorido, tem até o do Banco Nacional. Tudo igual.E o pior é que a gente sempre se molha. Ou seja, é um objeto que não deu certo, definitivamente. E mais, entra-se com ele na casa dos outros, nos restaurantes nos cinemas e vamos logo molhando o chão alheio. E depois, onde colocar aquela coisa flácida, molhada, respinguenta? O incômodo está instalado. E o pior é que a chuva passa, você vai embora e esquece o guarda-chuva em algum lugar. Sempre.
Será que a ciência, tão adiantada para várias direções, nunca vai dar um jeito de inventar alguma coisa moderna, um líquido, por exemplo, que a gente daria uma espreizada e ficaria imune das gotas de água? Será que nunca poderemos dançar na chuva sem precisar de um guarda-chuva?
Sem falar no nome do objejo, que está errado. Porque, decididamente, ele não guarda chuva nenhuma. Talvez em espanhol tenha um nome melhor: paráguas.
Sem contar nos motivos de riso que, às vezes, tal objeto nos oferece. Lembro-me do enterro de um velho tio no interior. A viúva, já velhinha, foi de peruca para o sepultamento do marido. Quando o caixão estava descendo para a cova definitiva, caiu a maior tempestade. Um parente, ao lado da desconsolada, logo abriu o guarda-chuva para proteger a velhinha, que já estava toda molhada de sinceras lágrimas. E não é que a varetinha do velho objeto arrancou a peruca da velha? E nem o parente e nem a abalada viúva perceberam o incidente? A peruca ficou lá em cima, pendurada na varetinha, exposta à chuva torrencial. Mas as pessoas que estavam do outro lado da tumba não só viram o inusitado espetáculo como trocaram o choro sentido por gargalhadas ruidosas. Até o padre engasgou o seu latim. E a coitada da minha tia lá, toda molhada. E careca.

2 comments:

Anonymous said...

Oi!!
Adorei os textos!!!!
Beijinhos

oliveira1984 said...

gostei do texto mas pra que tanta implicancia c o guada-chuva? rs eh tao retrô