Eu já falei aqui antes – já há algum bom tempo, na verdade – que sou fã do Ivan Lessa. E reitero a afirmação, não porque o velho mereça a minha particular opinião, pois acredito que ainda que soubesse desse viajante ele não se importaria muito nem faria caso da minha “fanzice”, mas simplesmente porque aquilo que é bom, data venia, merece ser celebrado.
E aqueles que reconhecem o que é bom poderão dizer que é fácil gostar do Ivan Lessa, do mesmo modo que um dia ouvi que era fácil torcer pro Barcelona (sim, internacionalmente eu sou Barcelona!), e sem querer comparar o texto de Lessa com o toque de bola do Barça, digo que bom- gosto de fato não se discute.
Lessa é a personificação sofisticada daquela expressão vulgarizada, quase clichê, da fina ironia. Aquela que muitos buscam e poucos alcançam. Claro, foi o editor do historicamente-histórico jornal O Pasquim e só isso explicaria sua importância e qualidade. Mas ele também mora há uns 40 anos na Inglaterra, e de lá é colunista da BBC (“pago para dar palpite”, como define) e isso também deve tê-lo ajudado a desenvolver essa certa característica de motejo, digamos assim...
Enfim, li sua coluna hoje e não resisti compartilhar aqui no blog, não porque esse seja seu melhor texto, senao porque é sempre bom aprender.
ENTREVISTA EXCLUSIVA COM UM ILEGAL
“Blam! Não sei se essa é a onomatopeia correta para o fechar das seculares portas da União Europeia para estrangeiros desqualificados, ou seja, que não pertençam à UE. Fato é que seja com “Blam!”, “Kaboom!”, “ou “Plaft”, a entidade não está mais aceitando essa “gentinha à toa”, conforme dizem os burocratas da Comunidade à boca pequena, sub rosa e sobre cravo.
Fiquei sabendo do fato, pouco divulgado nos meios de comunicação britânicos devido ao advento de Wimbledon e de fotos e videoclipes ousados de Beyoncé, aqui mesmo neste site, que eu continuo cismando de chamar de sítio, em homenagem ao conhecido racista, o mulato Monteiro Lobato, e algumas de suas criações, tais como Emília, o Visconde de Sabugosa, Narizinho Arrebitado, Pedrinho e a afro-descendente Tia Nastácia.
Lá estava, e o leitor curioso poderá encontrar fácil, uma bela reportagem sobre o evento em questão. Dou um pequeno resumo dos fatos mais salientes e assanhados antes de prosseguir com meu furo jornalístico.
Consta, e não há motivo para se duvidar, que 6.072 brasileiros foram barrados no bloco ou entrudo da UE em 2010. E isso só em aeroportos. Pesquisas por mim levantadas revelaram que outros meios de transporte são mal vistos por nossos conterrâneos ou por eles desconhecidos.
O navio é um exemplo maior. A jangada, um bem menor. Um entrevistado (aguentem, ele vem aí) garantiu que não sabe montar uma jangada, mostrando até desconhecimento da existência do romântico e letal meio de transporte e vida imortalizado pelo nosso grande Dorival Caymmi em várias de suas românticas obras-primas.
Os dados foram adiantados pela Frontex, que, assim mesmo, com nome de traje de banho ousado feminino, cuida do controle de fronteiras da UE. Os brasileiros constituem, ainda, o 6º grupo com permanências ilegais flagradas. Trinta por cento dos “brazucas” (sejamos docemente íntimos e vulgares) preferem a Espanha, onde, acreditam, a língua não chega a ser problemas, pois a maior parte de nossos imigrantes considera o espanhol uma vil corruptela do nosso nobre português.
Por falar em Espanha, 1.813 compatriotas nossos são enviados de volta para o Brasil, coitados, coitado. Um dado de que a BBC Brasil não se ocupou muito: a diferença entre “estada” e “estadia”. Ao que parece uma é coisa de marinha mercante, outra de permanência. Mas não me perguntem qual. Nem a qualquer entrevistado, com destaque para (calma, ele está tomando um caipirinha).
E à França, nada? Um pouco. Apenas 673 barrados e enviados de volta. O entrevistador perguntará ao entrevistado se ele acha que a crise econômica não tem mais o mesmo encanto para aqueles que querem, ao menos, uma mesa de restaurante para limpar. E já adivinho a resposta: “Ahn...Hem? O quê?!”
Voltando a 2010, embora o passadismo não esteja com nada, 13.669 brasileiros vivem, ou “vivem”, ilegalmente em algum país da UE. A maioria, rolando no chão de achar graça, prefere Portugal e seus habitantes, para eles “uns... ahn...pândegos”, Espanha e França. Afeganistão, Albânia, Sérvia e Argélia estão na nossa frente em matéria de se mandar para cá no peito e na marra, com muito lenço e sem nenhum documento.
Da América Latina, nenhum outro país têm barrado em aeroportos, ou onde quer que seja, imigrantes ilegais. Nem mesmo o Paraguai, país que teve a gentileza de nos ceder às cores de sua bandeira (grená foncé tipo Château Pétrus e azul cerúleo equatorial) para ilustrar este sítio que V.Sa. tem diante dos olhos.
E que ainda não entrevistou o brasileiro ilegal sediado e residente em Londres, pombas! Ambos, entrevistador e entrevistado, deverão se quedar no anonimato por motivos óbvios. Lá vão as perguntas (P) e respostas(R):
P – Como é que você se sente vivendo na ilegalidade?
R - É, ahn, mais ou menos, assim, sacumé, tem, ahn, seus momentos.
P - Você tem saudades do Brasil?
R - Depende, ahn, assim, do, quer dizer, ahn, ponto de vista, né?
P - Quais os seus planos imediatos?
R - Ahn, que quer dizer, ahn, “emediato”?
P - Solta minha mão.
R - Não. Me dá um beijim.
P - Solta minha mão, eu estou pedindo com modos.
R - Não solto. Só um beijim.
P - Você quer que eu chame a polícia?
R - Ahn, não.
(Esta entrevista tem direitos exclusivos reservados. Proibida sua reprodução, in Totó ou parcial, sob qualquer forma ou espectro. Muito obrigado.)