Monday, 29 December 2014

Textos Curtos para Ítaca XXXII (?)

Inexpressões
 
Cactos e flores roxas em São Paulo.

Visões antifuturistas na Paraíba.

Sons de trens.

Metades British-catalanas, respirações centro-americanas.

Real de Recife.

O real é formado por imaginados

O imaginário é formado pelos sentimentos dominando as percepções.

O espiral de viadutos é real. O que se parece um boliviano sentando ao vão com sua namorada que-não-se-sabe-de-onde-é para fazer uma selfie ainda é real.

E também o é, imediatamente à direita – assim que estou ao meio – o senhor franzino e grisalho de fisionomia oriental preenchendo o ar com os sopros do seu cigarro fétido.

Assim que estou ao meio.

Tudo que acontece aqui é real e imaginado.

Mas até agora nenhum vendedor ambulante, só cicatrizes: “Andei só pela noite” / “Mica Jairo J.” / “4.20” / “Vergonha” / “Transporte Público Gratuito”/ “Tay Dell” /

É real e imaginado a onomatopeia do sapato tocando a pedra ao saltar ao solo levando um indivíduo com camisa-pra-dentro-das-calças com ele.

São muitos atores, são muitas ausências.

O ritmo do coco é poder enquanto te imagino, realmente, do outro lado do Capibaribe.

Também quis olhar para baixo a cada espaço deixado entre os grupos de pessoas sentadas.

Só de curioso, só por impulso.

 Mas é feroz dos dois lados a passagem de onde posso ver tudo desse singular interim.

Pequenos textos são um alívio avulso.

Agora já são dois vendedores ambulantes; um de doce, uma de pulseiras, que ofereceram à minha direita e à minha esquerda, mas não a mim.

Assim que estou ao meio.

E este é um fim.

Friday, 12 December 2014

"para que não se esqueca, para que nunca mais aconteça"

Apesar das lacunas, criticadas até por militantes históricos de Direitos Humanos no Brasil, a entrega do informe da Comissão Nacional da Verdade (CNV), no dia 10 de dezembro de 2014, é um marco inconteste do processo de democratização do país, especialmente diante da conjuntura presente, logo de mais de três décadas de obscurantismo.

  Logo de uma eleição federal complexa, polêmica e polarizada em larga medida, vê-se cidadãos, de percepção política atrasada ou de deliberada má-fé, que... vão às ruas brasileiras pedindo pateticamente uma intervenção militar na condução política nacional. Por isso trazer à luz agora, oficialmente, as denúncias dos abusos e atrocidades realizadas nos períodos de regimes autoritários é essencial. 

 Como disse o presidente da CNV, Pedro Dallari, "o informe da Comissão acaba com qualquer nostalgia da ditadura"; explica principalmente aos mais jovens, e de todxs aqueles que não vivemos diretamente, onde me incluo, as violências do autoritarismo institucional no país, os malefícios do seu legado, que nos afeta a todxs no Brasil.

  O informe da CNV deve dar terreno para um novo período de lutas contra a impunidade e a favor da justiça no Brasil, baseada na denúncia das dívidas históricas do Estado brasileiro. A agenda de uma profunda reforma política, através de uma Constituinte, ganha força, e já há rumores de que inclusive no Supremo Tribunal Federal há margem para afastar, por fim, os obstáculos jurídicos à penalização dos violadores dos Direitos Humanos e da democracia no Brasil, como a própria Lei da Anistia.

Ao longo dos anos, pelo menos desde 2008, tenho acompanhado as discussões sobre Memória Histórica e Justiça de Transição, principalmente em El Salvador e no Brasil, nos meus dois países onde, igualmente, a lei de anistia é uma grande barreira. Tenho desde então escrito algo sobre os temas, deixo aqui e nos comentários alguns links de exemplos dessas pequenas contribuições: