Wednesday, 4 April 2012

Video nas Aldeias comemora 25 anos com críticas ao governo federal


“Para os índios, o governo Dilma é um belo retrocesso”. A declaração é do cineasta e indigenista Vincent Carelli (foto), fundador da prestigiosa organização Vídeo nas Aldeias, durante atividade na noite de ontem, em Recife, do lançamento do livro-video que celebra os 25 anos do projeto. Vídeo nas Aldeias se dedica a formação de cineastas indígenas em mais de 120 aldeias brasileiras e, com sede em Pernambuco, é referencia internacional de trabalho com audiovisual indígenas.


Nascido em Paris, mas criado em São Paulo, Carelli se dedica há mais de 40 anos às temáticas indígenas com trabalhos junto a Fundação Nacional do Índio (Funai), universidades e ONGs. É o diretor de “Corumbiara”, premiado como melhor filme no Festival de Gramado em 2009, e com o Vídeo nas Aldeias obteve reconhecimento por colocar o vídeo como um instrumento da expressão da identidade indígena e refletir as visões de mundo de 37 povos de 127 aldeias do Brasil, com apoio sobretudo da cooperação internacional de instituições da Holanda e da Noruega. Além treinar e equipar as comunidades com equipamento de vídeo, o projeto estimulou a troca de informações e de imagens entre as nações indígenas.


Um livro-vídeo bilíngue, com depoimentos, ensaios críticos e fotográficos e mais de seis horas de filme, celebra os 25 anos do projeto. A publicação, patrocinada pelo banco Itaú e pela Natura através da Lei Rouanet, com apoio do programa Cultura Viva do Ministério da Cultura, foi apresentada no Cinema da Fundação em Recife, com a projeção do filme Guarani "Bicicletas de Nhanderu". Carelli, que conversou com o público após a projeção, foi duro nas criticas às posições governo federal sobre as questões indígenas. “O espírito desenvolvimentista do governo Dilma bate de frente com os direitos indígenas. Há muito dinheiro para a construção de hidroelétricas, mas investimentos em áreas indígenas só ocorrem quando há necessidade de negociações geopolíticas, as outras áreas estão abandonadas. O deputado federal Aldo Rebelo, que já foi secretário de coordenação política do governo e hoje é ministro dos Esportes, chegou a declarar que a presença de índios em áreas de fronteira é uma afronta a segurança nacional”, apontou.


Carelli considera que hoje a autoridade da FUNAI é “decrépita”, mas acredita que, paradoxalmente, essa ausência foi salutar para a organização dos povos indígenas. “Os índios passaram a buscar formas alternativas de organização, romperam com uma relação paternalista e dependente de apenas três mil funcionários de um único órgão e foram atrás de outras formas de associação”, avalia. Atualmente os temas tangentes as comunidades indígenas, como saúde e educação, são tratados por outros órgãos governamentais que não apenas a Funai. “É isso que os índios querem, mais interlocutores, mais canais para serem ouvidos”, afirma Carelli.


Uma câmera na mão e uma cabeça aberta -


A extensiva produção resultante de 25 anos de oficinas – num total de 7 mil horas de vídeo – começou a atingir um circuito maior em 2009, com o lançamento da série de DVDs Cineastas Indígenas, disponíveis em livrarias. Organizados por etnia, os DVDs trazem os principais filmes de um grupo de realizadores com legendas opcionais em várias línguas (Português, Espanhol, Francês, Inglês, e alguns em Italiano) e são acompanhados de um livreto com textos e fotos.


No mês de julho o Vídeo nas Aldeias deve fazer o lançamento do seu terceiro trabalho para o IPHAN, com um filme realizado por índios guaranis que conta as histórias das reduções jesuíticas e das guerras guaraníticas no território que vai do Paraguai, passando pelo Rio Grande do Sul até o Espírito Santo. Todo realizado em Guarani, o nome provisório é Tava, a casa de Pedra. “Simbolicamente, é muito importante o governo reconhecer que há a versão dos vencidos”, pondera Carelli.

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