Monday 2 May 2011

Festa da Lavadeira - 25 anos de cultura popular de resistência




Desde 1888, num episódio de luta, e tragédia, nos Estados Unidos, o dia 1º de Maio passou a ganhar referência em todos os continentes - é uma data fundamental na história da resistência popular. Deveria ser lembrado como um dia de reflexão sobre o trabalho e a construção da cidadania popular, mas no Brasil a data é muitas vezes apenas um dia de feriado, distribuição de prêmios e de grandes shows nos principais centros do país.


E embora isso se reflita também em Pernambuco, aqui o 1º de Maio é dia de algo mais: é o dia da Festa da Lavadeira.


Na praia do Paiva, no município do Cabo de Santo Agostinho – região dos bilionários investimentos do Complexo Portuário-Industrial de Suape – ocorre há 25 anos esse que é o maior evento/festa de cultura popular, tradicional e de terreiro de Pernambuco.






















Participei da edição deste ano que teve pelo menos um terço da sua força, mas foi o suficiente pra perceber, e se envolver, com esta poderosa reunião de expressões culturais, artísticas e religiosas de matriz afro-brasileira como Afoxés, Maracatus, Cirandas, Cocos de Roda, Caboclinho Cavalo Marinho e outros


A Lavadeira é um ancestral filho do Orixá Iemanjá. Em maio de 1987, a escultura de uma “lavadeira” foi colocada em frente a uma casa na praia do Paiva. A estatua despertou o interesse da comunidade nativa da praia que a nominou de “mulher”. As pessoas a visitavam, levando oferendas.


É uma festa essencialmente de matizes negros e índios que agrega, chama pra junto, congrega os povos. A Lavadeira é instrumento dos Orixás, Mestres, Mestras, Caboclos, Exús e Trunqueiros, uma cultura de resgate de manifestações culturais brasileiras.


A Festa da Lavadeira, ao longo do tempo, ganhou contornos de resistência popular em defesa das matrizes destas expressões culturais contra a mercantilização da arte. Ela sempre acontece no do Dia do Trabalhador, e já chegou a reunir cerca de 80 mil pessoas. Já recebeu por duas vezes do Prêmio IPHAN de melhor projeto de divulgação da cultura popular no nordeste, em 1998 e 2008. Em 2007, recebeu o “Prêmio Culturas Populares” do Ministério da Cultura. É, também por força de Lei Estadual, patrimônio público cultural de Pernambuco. Há uma Lei Municipal do Cabo de Santo Agostinho que também ampara a Festa como patrimônio público.


RESISTÊNCIA DA CULTURA POPULAR


Mas toda esta simbologia cultural tem sido ameaçada pela construtora Odebrecht. Esta empresa está construindo um condomínio fechado de luxo na praia do Paiva, um empreendimento milionário, que já conta com pedágios para segregar o acesso público – o único pedágio de Pernambuco!


Em 2010, a festa só aconteceu por força de um termo de ajuste de conduta feito no Ministério Público. Este ano, a Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho, através de uma lei municipal de dezembro passado descaradamente aprovada para atender os interesses da Odebrechet, estabeleceu limitações à presença da população na área denominada Loteamento Reserva do Paiva, na praia onde ocorre a Festa.


A Construtora Odebrecht, quando quis aprovar seu projeto milionário no Paiva, em seu site afirmava que iria respeitar as manifestações culturais da região e o desenvolvimento sustentável das comunidades vizinhas. Exatamente por isto a área onde acontece a Festa da Lavadeira foi garantida no projeto Reserva do Paiva como área de uso comum, área pública, para permitir a manutenção e desenvolvimento da manifestação popular.


A Odebrecht parece empenhada em querer “privatizar” a praia do Paiva. Através dessa legislação a prefeitura local aprovou ato de segregação em relação ao público da Festa da Lavadeira, constituído, em sua grande maioria, por mulheres e homens da classe trabalhadora. Esta atitude de APARTHEID não tem como objetivo a preservação do meio ambiente, mas a preservação do poder econômico privado. O episódio remete ao pensamento do período colonial, onde o negro e o índio não podiam tocar seu tambor, fazer seus rituais, viver em liberdade.


Mas o povo estava na praia do Paiva hoje! E até a chuva deu uma trégua, nesta época que tem chovido muito em Pernambuco, para que a festa acontecesse. No lugar dos palcos – estrutura que não foi cedida para o evento – um trio elétrico recebeu as atrações, como grupos de coco e de maracatu. E o povo dançou em volta do trio até o final da tarde.


Um grupo de grafiteiros pintava painéis de madeira. : “25 anos de resistência / Festa da Lavadeira”, “Odebrecht x cultura”, “A festa é do povo” e “O Paiva não é Auschwitz.


Um dos coordenadores, Eduardo Melo, resumiu; “A Festa da Lavadeira está além. Seria ótimo manter aquela estrutura. Mas estas objeções sugerem que a festa pode usar muito mais o chão do que o palco. Nossa origem é no chão. A festa tem a identidade da cultura popular. Ficou como se fosse uma grande vitória. A força e o amor do pernambucano por sua cultura”.

3 comments:

Anonymous said...

jealous from cyprus
my man of resistance

love and light from the mediterranean

Lis said...

Eu só tenho duas coisas a dizer:
Uma: essa festa deve ser muuuuuito massa!
Duas: a atitude dessa construtora é, como dizem os meninos aqui do predío, "maior paia"! Ridícula mesmo!

E vc é um lindo!
Bjo!

D&R said...

Essa sempre foi uma das minhas festas preferidas. Lembro de ter falado dela pra tu, anos atrás. E tu veio ver! Pena que a lembrança da festa na tua mente não é a mesma que eu tenho na minha: a praia cheia, colorida e tanta música quanto podes ouvir e separar os ritmos. Mas, ainda assim, valeu a pena a estrada ruim, as nuvens no céu, a lama nos pés e os olhos curiosos. E, ah, um dia eu aprendo a dançar côco! Ah, se aprendo! E nesse dia, não vai haver nada nesse mundo que eu não possa fazer! ahahahaha