Sunday 12 July 2009

Teoria politica para a América Latina?


Um exercício de resumo interpretativo dos seguintes textos publicados na Agencia Carta Maior: “América Latina, um continente sem teoria” (Jose Luis Fiori) e “América Latina, um continente sem teoria?” (Nildo Ouriques)

Teorias politicas europeias sobre a América Latina (AL) não eram comuns no século XIX. As atenções do Velho Mundo estavam voltadas para Ásia e África em função das questões coloniais.

No começo do século XX a teoria marxista sobre imperialismo se dedicou ao estudo da internacionalização do capital e seu papel no desenvolvimento capitalista, mas seu foco ainda era a competição e a guerra entre os países europeus.

Na década de 20 a III Internacional transformou o imperialismo em adversário politico, tido como um obstáculo ao desenvolvimento das forcas produtivas nos países “coloniais e sem-coloniais”. Depois de 1940, a estrategia de “revoluções nacionais” (aliança entre proletariado e a chamada burguesia nacional, tipico do que defendia o Partidão, PCB, no Brasil) se estendeu a AL em favor da industrialização dos países periféricos.

Nos anos 60, depois dos “anos de ouro” do capitalismo da década de 50, onde as estrategias para a AL se pautavam, basicamente, na estrategia nacional-desenvolvimentista (industrialização para substituição das importações), as diferentes crises econômicas que a cada momento se deflagrava em diferentes partes do globo, e o cenário de instabilidade politica na AL (com golpes militares respaldados pela politica intervencionista dos EUA, dentro da logica da Guerra Fria, e guerrilhas revolucionarias socialistas) deu origem as “teorias da dependência” que buscavam explicar as relações politicas no continente.

Segundo Jose Luis Fiori, essas teorias tem 3 vertentes: a marxista (o imperialismo e o desenvolvimento dos países centrais é um obstaculo intransponível para o desenvolvimento do capitalismo periférico); a da Comissão Econômica para América Latina, CEPAL, (que também via obstáculos a industrialização do continente, mas apostava que era possível superá-los com “reformas estruturais”, que virou a agenda politica da região) e a que unia as duas análises (que defendia a viabilidade do capitalismo latino-americano através de uma “associação” ao capitalismo dos países centrais).

Para Fiori, essa postura foi “A repetição recorrente de algumas platitudes cosmopolitas, foi mais do que suficiente para sustentar sua visão da economia mundial, e legitimar sua ação política e econômica idêntica em todos os países”, o que prova que os liberais nunca tiveram uma teoria original a respeito da América Latina.

Contudo, Nildo Ouriques afirma que as teorias da dependência sempre foram mal compreendidas no Brasil e não como fruto do acaso, senão como consenso construído nas principais escolas de Ciências Sociais do pais (USP e Unicamp) e que resulta legitimador do capitalismo dependente do pais.

Ouriques argumenta que a vertente marxista da teoria da dependência costuma ser criticada de maneira leviana por esses setores da academia paulista que realizam, nas suas palavras, uma “manufatura do consenso” quando alinham a vertente marxista com a formula “desenvolvimento do subdesenvolvimento”, criada por Andre Gunder Frank e desse modo exerce, em ultima instancia, uma critica injusta e distorcida sobre o pensamento de Frank.

O professor da UFSC defende que Frank jamais disse que o capitalismo era inviável na periferia e desbancou as teses “míticas” sobre a feudalidade na América Latina e sobre a idéia dos obstáculos externos ao desenvolvimento na AL. (referencia: Capitalism and Underdevelopment in Latin America). “Gunder Frank afirmava que o desenvolvimento capitalista efetivamente ocorreria, mas sob a forma do subdesenvolvimento”, opina Ourique.

Ainda segundo o professor da UFSC, durante as lutas pela democratização do Brasil, depois do golpe de 64, os liberais progressistas contribuíram para o “apagão mental” a que se refere Fiori e desqualificaram as teorias marxistas de dependência sem considerar os aportes de Frank.

Nesse sentido, uma de suas opiniões é particularmente interessante: “Parte daquele “apagão mental” é produto da outrora útil distinção partidária entre tucanos e petistas que sempre ocultou algo importante, cada dia mais difícil de disfarçar: no terreno teórico, tanto uns quanto outros se alinhavam na manufaturação do consenso em favor da versão palatável dos estudos acerca da dependência, representada por Cardoso e Faletto. Não é apenas uma coincidência que a tese doutoral de Guido Mantega, finalmente vertida no livro que adultera completamente as teses de Frank e Marini, foi orientada por Fernando Henrique Cardoso.”

Ourique conclui considerando que as recentes mudanças ocorridas no cenário politico latino-americano resgatam a real vertente marxista das teorias da dependência como se vê em governos como de Venezuela, Equador e Bolívia.

1 comment:

D&R said...

é meio complicado o que venderam como teoria da dependência no brasil. o nome é simples, claro e sintetiza todo o pensamento: não existe desenvolvimento, existe subordinação e dependência. não existe isso de desenvolvimento por etapas porque as etapas não são iguais para todos os atores envolvidos, isso porque as relações centro-periferia não são iguais! É uma coisa lógica, mas que FHCs e as CEPAL da vida subverteram, tomando como certo que a saída para o subdesenvolvimento seria a modernização da economia e a industrialização dos países. Deu certo? Até agora não vejo nada consistente. O engraçado é ver essa teoria ser ofuscada pela versão "palatável" da CEPAL e do FFHHCC. Claro, isso se deve ao momento em que isso foi produzido. Em momentos ditatoriais é muito melhor ouvir que o capitalismo dá jeito nas coisas do que ouvir um Rui Mauro Marini começar um de seus livros (o orgástico Dialética da Dependência. tens que ler!!!), citando Marx e dizendo que o Comércio Exterior, se só se limitar a reposições (suprir necessidades onde há defasagens), não faz mais do que distribuir contradições num campo maior. Suprir as necessidades do desenvolvimentismo no capitalismo é super-explorar os trabalhadores. Enfim, se criaria um imenso ciclo de desigualdades e contradições que não levariam os países a nenhum lugar. Por isso não tem lógica falar em "países em vias de desenvolvimento" pq não existe um movimento "hacia" o desenvolvimento. O que existe são países subdesenvolvidos (sem idéia de movimento, pq ele não existe). E voltamos à velha questão do não existir desenvolvimento/igualdade no capitalismo, a industrialização não é chave pra nada e a solução segue sendo a ruptura com a própria dependência e, por tabela, com o capitalismo.
É uma teoria bonita. =)