- outro texto meu publicado no
Nota de Rodapé, sobre as eleições deste 2 de fevereiro em El Salvador e na Costa Rica.
Também pode ser acessado
aqui, no blog do Núcleo de Pesquisas D&R.
"Amanhã, 2 de fevereiro, é
uma data de extrema relevância para a América Central. Dois países do pequeno
istmo entre o Norte e Sul do continente, situado na periferia do sistema pese
estar no centro geográfico e ter uma importância estratégica em política
internacional, realizam suas eleições gerais: Costa Rica e El Salvador. Novo
período de eleições livres e universais é sem dúvida um momento de celebração
das liberdades civis para toda a região, dado o amplo retrospecto de crises e
autoritarismo dos países que a compõem, mas também uma ocasião para a reflexão,
que deve ser exercido com o voto de cada cidadão, sobre projetos políticos que
efetivamente contribuam para fazer avançar Centroamérica em emancipações,
autonomias e bem-viver.
De forma geral veem-se duas grandes
linhas na atual conjuntura política centro-americana: o espaço para governos vistos
como progressistas e a tendência a polarização partidária.
Estão em jogo nessas eleições
concepções diferenciadas sobre relações estatais, mercado e sociedade, em que
se confrontam projetos, insistentes e impertinentes, de corte neoliberal, e outro
de cunho nacional-popular, mais comprometidos em tese com o social.
Na década de 90 as forças políticas
ligadas a esquerda enfrentaram um panorama desencorajador, com o avanço forte
do receituário neoliberal no istmo; uma situação que se via por toda a América
Latina, mas particularmente sentidas em Centroamérica em função dos contextos das
recém finalizadas revoluções populares que não alteraram a estrutura profunda
do status quo do poder.
Essa ordem começou mudar, porém, a
partir dos anos 2000 na América do Sul, mas na América Central ainda um pouco
mais tarde, com as posições reformistas de Manuel Zelaya em Honduras, com a
vitória da esquerda em El Salvador em 2009, com o retorno dos Sandinistas ao
governo da Nicarágua. O golpe de Estado em Honduras, aliás, também em 2009, pode
ser visto como um alerta para essa reorganização progressista na região de que
as forças da elite dominante não permitiriam medidas muito avançadas no campo
social, caso isso mexesse com as arcaicas e excludentes estruturas de poder dos
seus países, por parte dos novos governos que conquistaram espaço nas frágeis
democracias eleitorais a pouco estabelecidas.
Há agora uma renovação das
oportunidades para o progressismo. Em Honduras, nas polêmicas e ainda debatidas
eleições do final de 2013, o partido LIBRE dos Zelaya rompeu o tradicional e
perverso bipartidarismo elitista do país e influi nos rumos do governo. Na
Nicaragua, apesar de posturas impopulares e muitos questionamentos, o atual
governo sandinista de Daniel Ortega ainda conta com altos índices de aprovação.
Em El Salvador a disputa se dá
entre as duas forças consolidadas depois dos Acordos de Paz de 1992, o do retrógrado
conservadorismo e neoliberalismo da Alianza
Republicana Nacionalista (ARENA) e aglutinação de esquerda Frente Farabundo Martí para la Liberación
Nacional (FMLN), que ainda reúne forças da sociedade civil e de movimentos
sociais. E na Costa Rica a coalizão progressista do Frente Amplio gera expectativas e esperança de vitória.
O FMLN salvadorenho tem vantagem nas
pesquisas eleitorais e disputa a reeleição, pois conseguiu uma vitória
histórica nas eleições de 2009 com Mauricio Funes, um jornalista sem militância
na antiga organização guerrilheira mas com capacidade gerencial e que
reivindicou uma gestão de estilo do ex-presidente brasileiro Lula, amigo e
conselheiro, permitindo uma aproximação inédita também do Brasil no istmo.
Funes foi muito criticado por não ter
atendido com intensidade as expectativas de “cambio” proposto por sua campanha, pese ter feito um governo mais
socialmente avançado do que as duas décadas de neoliberalismo arenista que o
antecederam. O atual candidato da FMLN,
Salvador Sanchez Ceren, é um líder histórico da Frente, foi um dos comandantes
da guerrilha, e trabalha uma proposta de governo em três eixos: aprofundar as
mudanças iniciadas por Funes, consolidar a democracia e o Estado
constitucional, social, democrático e de direito, e acelerar a integração
regional para avançar a união centro-americana.
Na Costa Rica as forças progressistas
também levam vantagem, pequena, nas pesquisas eleitorais. A disputa se dá entre
um modelo neoliberal representado pelos partidos de direita, Partido Liberación Nacional, e Movimiento Libertario, e uma proposta
mais socialmente orientada, preocupada em combater a pobreza e a desigualdade
social, representada pelo Frente Amplio,
e Partido Acción Ciudadana, tendo à
frente o jovem candidato José María Villalta.
O clima nos dois países é de
incertezas e os cenários estão abertos. Centroamérica necessita justiça social,
já que as características mais tristes e evidentes da região, como migrações,
pobreza, desigualdades e violência são consequências da injustiça vigente.
Muitas instituições dos países do istmo funcionam a serviço de elites, e não a
serviço de todos e todas, menos ainda preocupados com os mais vulneráveis. O
crescimento econômico é importante para se obter recursos para investimentos sociais,
mas quando este não vai acompanhado de um desenvolvimento inclusivo, os
problemas aprofundam-se. Centroamérica merece um desenvolvimento social
equitativo que ofereça possiblidades de cultivar plenamente suas capacidades
humanas e políticas."
* * * * * * *
Aleksander Aguilar
é jornalista, doutorando em Ciência Política e Relações Internacionais, e coordenador do Grupo de Estudos América Central (GEAC) do Núcleo de Pesquisas Desenvolvimento e Região (D&R), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
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